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domingo, 28 de julho de 2013

Não estou em casa, hoje...

foto de: A&M ART and Photos

Esquilos, nozes em vozes, mamilos denegridos, absortos, lábios lânguidos, corpos absolutamente sós, como eles, e como nós, os vizinhos quando lhe batiam à porta em maciça madeira, ele, ainda embriagado pela poesia não escrita, escondia-se, fazia-se... morria, não percebendo depois, que tudo era a fingir, acordava, voltava a dormir, deixou de sorrir, deixou de viver, não queria passear-se pelas cansadas margens de um doente rio, vivia-se, e ia-se vivendo, não sabendo, nunca, o horário penumbro das amendoeiras em flor,
Descia-se,
Subia-se,
E chorava-se,
Esquilos vaidosos roendo nozes de brincar, fantasia, histórias ao almoçar, sobre uma pequena mesa, de pedra, no quintal, uma árvore e um pássaro, preto, bico amarelo,
Melro?
Melro, talvez, porque não?
Inchados, os pilares de areia que seguram as amarras das tristes varandas com murchas flores, ao longe, a praia, o silêncio, o corredio de machimbombos vomitando sonhos adormecidos entre o Baleizão e o Mussulo, batiam-me à maciça madeira porta, eu, eu escondia-me, ou simplesmente berrava
Não estou em casa, hoje,
E eles, elas, acreditavam..., tão parvos, e continuava fingindo dormir, quando na verdade, eu, eu estava morto, desde criança, morri, recordo-me vagamente, tinha alguns poucos, não muitos, seis anos de vida, lembro-me como se fosse hoje, era Setembro, brevemente começavam as vindimas
O que são vindimas, pai?
É o apanhar das uvas...
Uvas, o que vão uvas, pai?
Não percebia que as videiras
Pai, sim filho, o que são videiras?
Não percebia que as videiras davam uvas, que existiam cachos, e lembro-me como se fosse hoje, era Setembro, quase, quase começavam as vindimas, e lembro-me, morri, depois, embrulharam-me num lençol de água salgada, permaneci assim cerca de vinte e oito dias, era Outubro, caiam as folhas das árvores, e eu, eu perguntava-me porque caiam as folhas das árvores,
O que são vindimas, pai?
É o apanhar das uvas...
Uvas, o que vão uvas, pai?
Não percebia que as videiras
Pai, sim filho, o que são videiras?
E pela primeira e última vez, eu, eu tive vergonha de perguntar ao meu pai
Pai, porque caem as folhas das árvores?
Eu tive vergonha de perguntar ao meu pai se esta terra era para sempre ou apenas para eu brincar, e começaram as chuvas, e o frio, a geada e a neve, e eu, eu morto, fui ficando, fui ficando... embrulhado num lençol de água salgada.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó