Mostrar mensagens com a etiqueta Planeta 3. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Planeta 3. Mostrar todas as mensagens

sábado, 8 de março de 2014

O marinheiro imaginário

foto de: A&M ART and Photos

Não pertencias aos ciprestes voltados para o rio,
trazias na algibeira um punhado de tabaco, algumas gotinhas de vodka... e eras marinheiro fundeado na paixão dos homens,
olhávamos a ponte submersa nos rochedos vermelhos,
e sabíamos que nunca mais haveria sol dentro de nós,
eu, eu era uma gaivota suspensa nos teus lábios... e voava em ti como uma louca espuma depois do adeus,

Desenhávamos relógios de luar nas pálpebras de Belém,
dávamos as mãos... e caminhávamos até deixarmos de ver as estrelas,
o silêncio transformava os cigarros em longos suspiros que só o desejo percebe,
e sabe,
e às vezes, poucas, éramos visitados pelo “chapelhudo” vestido de verde seara de trigo,

Não pertencias aos ciprestes e tínhamos inventado o alegre som melódico das palavras,
(acorda agora o “Planeta 3”)
os corpos murchos deambulavam nos cansados campestres telhados de colmo,
não pertencias nem nunca pertencerás às engasgadas folhas de papel pardo, sem poemas, nuas como nós,
e tínhamos uma noite imaginária dentro de uma Lisboa que escrevia nos nossos corpos o desassossego,
e eu, e eu gostava do teu olhar que transpirava vogais com sabor a amêndoa e a chocolate,

Vinha o dia e com ele, os círculos e os quadrados..., vinha o dia e tu não me pertencias,
vagueavas de esquina em esquina,
de cidade em cidade, e de porto em porto, de barco para barco,
e os cigarros fumavam-se sem que eu percebesse a tua ausência, e tu não estavas lá, como sempre, eras apenas uma sombra da noite com roupas de amanhecer, talvez fosses a madrugada, ou... o rio sem palavra,

E nada como dantes, Dead Combo, e uma esplanada vazia, hirta... sem coração,
Lisboa pertencia aos guindastes com dentes de marfim,
sentávamos-nos sobre a calçada descalça, e via-mos os beijos das estátuas de granito abraçados aos sofás de ardósia esperando o regresso da tarde, e vinha a tarde... e queríamos a noite, a noite só para nós...
e não, nunca, pertenceste ou pertencerás aos ciprestes voltados para o rio.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 8 de Março de 2014