sábado, 27 de janeiro de 2018

É noite


É noite. Todas as correntes de aço que aprisionam os teus cabelos estão suspensas num simples suspiro, oiço as palavras, lá longe, o enigmático silêncio das janelas de vidro, regressa a noite, a cidade arde nas mãos do sem-abrigo, uma nota de cinco euros voa nas esplanadas da solidão,

Tem lume?

Os candeeiros da paixão, emagrecidos, com fome, as ruas desertas antes de acordar a manhã,

Não. Não tenho lume!

As pedras enraivecidas, o ódio dos pilares de areia que abraçam os barcos da madrugada, os poemas famintos no corpo do poeta, está morto, esquelético, e sem palavras…

Lume não tenho. Cigarros não tenho.

É noite.

O chá e as torradas vulcanizadas nas montanhas das crateras ensanguentadas dos rochedos nublados, é noite; e sinto-me completamente colorido com o arco-íris das sílabas entre pássaros e vinhedos, e ao fundo, o magnifico rio da saudade,

Os cigarros,

As esmeraldas na algibeira do sem-abrigo, a barba quase toca no luar, o cheiro nauseabundo das ruelas sem sentido, os automóveis sibilados nos corredores da morte, e nada te desejo.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 27 de Janeiro de 2018

domingo, 21 de janeiro de 2018

Jangada de nylon


Os poemas morrem na tristeza do teu olhar.

Como sofre o dia nos teus ombros,

Enquanto lá fora, ainda noite, uma jangada de nylon gagueja em frente ao mar,

As lágrimas no teu rosto,

O silêncio das tuas mãos quando afagam o meu rosto…

Distante maré no meu corpo abalroado nas insignificantes janelas de vidro,

Os tentáculos de seda, todas as coisas impossíveis, nas tuas mãos,

Quando regressa a madrugada.

Choras.

Escreves nos meus braços as palavras invisíveis da tempestade,

Os barcos ancorados aos teus dedos…

E sofres.

E morres de mim.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 21 de Janeiro de 2018