sábado, 11 de janeiro de 2014

A espera

foto de: A&M ART and Photos

Inspiração quanto baste, três desejos e um sonho, o mar sumarento e sensível como a pele límpida da alvorada, quatro árvores desajeitadas e sem sono, uma drageia ao pequeno-almoço e outra...
Ao deitar?
E a outra e mais outra, a inspiração, o orvalho, o soalho e o espelho, a cama em lágrimas e o sofrimento impregnado nas lâminas transversais do gesso embriagado, quatro árvores em decadência, um corpo suspenso na madrugada, a chuva, as nuvens apaixonadas pelo triste cacimbo... e nada mais, e apenas um menino
Ao deitar?
Quatro drageias, três árvores em desejo misturado em cinco quintos de sonho, uma
Merda?
Ao deitar?
As fotografias em constante transbordo, a locomotiva da paixão descarrilou, ravina abaixo, ravina acima, a mini-saia encarnada e as meias com bolinhas brancas, no joelho a nódoa negra, a pedra em granito que caiu do silêncio camafeu em robe e velho pijama, o corredor, a espera, a derradeira espera, uma janela, cigarros na mão, ao longe, ao longe o metro de superfície parecendo uma lesma sobre os muros em xisto do Douro Vinhateiro, socalcos de pano, lanternas na cabeça, e a burra... tropeçando, e a burra...
Ao deitar?
Desesperado eu, a inspiração em drageias, quatro, cinco... ou nenhuma... as janelas embebidas na dor e eu sentado, braços cruzados, braços descruzados, e eu... compro cigarros, e eu... não compro cigarros, e eu... desesperando, pensando, pensando
O que será de nós?
E ao deitar,
Não sei se a imaginação vive dentro de mim ou se eu, e eu... compro cigarros, e eu... não compro cigarros, cruzo os braços, descruzo e enrolo-me à dor dos presentes, fumo, não fumo, abro a janela, não abro a janela... apetece-me saltar, aterrar do outro lado da rua, cair sobre os carris do metro, deitar-me de barriga para o céu... e gritar, e... e chorar..., e
Ao deitar tomo as drageias da saudade, meio copo com água, um copo com uísque, dissolvidas todas como sementes junto à eira em Carvalhais, irrita-me
Ao deitar?
O metro de superfície correndo como um louco, e dizem que o louco sou eu, cruzo, descruzo, invento desenhos nas paredes incolores da tristeza, oiço-os em conversas desalinhadas, finjo não os ouvir, eu não os quero ouvir,
Ao deitar? E ao deitar a sonolenta voz das palavras, a neve sobre os telhados que a dor deixa nos malditos ossos, frágil – cuidado, cuidado com o cão, cuidado com as carruagens do metro de superfície engasgadas, tosse e rouquidão, não sei se fume, não fume ou fume, comprar cigarros, saltar a janela, saltar o gradeamento, saltar os carris... e eu... e eu imaginando cigarros nas paredes coloridas da cela, a porta abre-se...
E?
O que será de nós?
E ao deitar, o perfume da Cinderela passeando junto aos carris...
(desesperado eu, a inspiração em drageias, quatro, cinco... ou nenhuma... as janelas embebidas na dor e eu sentado, braços cruzados, braços descruzados, e eu... compro cigarros, e eu... não compro cigarros, e eu... desesperando, pensando, pensando
o que será de nós?)
Inspiração quanto baste, três desejos e um sonho, o mar sumarento e sensível como a pele límpida da alvorada, quatro árvores desajeitadas e sem sono, uma drageia ao pequeno-almoço e outra...
Ao deitar?
Ao deitar as drageias, os silabados imaginados por um louco que depois da felicidade deseja voar como gaivotas sobre os petroleiros vampiros que habitam os rios dos velhos sonhos de infância,
Não sei, não... sei... não sei se ele conseguirá...!
Talvez,
Ao deitar?
Talvez... talvez ao deitar.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 11 de Janeiro de 2014

… rochedos da saudade

foto de: A&M ART and Photos

Diluímos-nos com os velhos vapores que a solidão alicerça nos rochedos da saudade
habitávamos num fino e escuro cubículo de paixão com telhado de vidro
tínhamos na mão a varanda do suicídio construída com as raízes do medo
e voávamos como serpentes de papel nos cortinados das lareiras sem nome...
éramos o ébano lençol de seda com desenhos bordados a fogo
descíamos das nuvens embebidas em frestas de gesso e pedaços de madeira envelhecida...
fugíamos... fugíamos como loucas pedras em granito esquecidas na espuma do Pôr-do-Sol
inventávamos o mar dentro das nossas veias onde corriam insectos e outros objectos da noite
luzes
néons como venenos que iluminavam a madrugada das livrarias empoeiradas
diluímos-nos com os velhos vapores...
… rochedos da saudade,

Há uma saudade invisível nos socalcos da cidade das marés lunares
um barco de sémen navega sobre a tua pele doirada quando pintada com pincéis de aço
o teu corpo se transforma em fome
os teus braços desassossegam todos os transeuntes mendigos da dita cidade das marés lunares...
uma criança procura chocolates de areia nas algibeiras do segredo
corre como uma lebre talude abaixo
e do sol chegam até nós os prometidos apitos dos vapores que a solidão... alicerça... a saudade...
submerges nos êmbolos loucos dos relógios de parede
saberás abraçar-me?
desejo-te em cachimbos de madeira voando como gaivotas em silêncios de tabaco
o perfume entranha-se nas grades do soalho das pequenas sílabas que dormem no quarto do grito
e uma outra criança chega a ti e pergunta-te... porquê pai?


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 11 de Janeiro de 2014

Desilusão

foto de: A&M ART and Photos

Acreditava que o sonho se vestia de branco
que em todos os jardins existiam esqueletos de aço com coração de veludo
e que em todas as palavras pronunciadas...
escritas
e apaixonadas... habitavam as mãos do delírio sono extinto das noites circunflexas
tínhamos no sono a ânsia de viver dentro dos poços das amoreiras em flor...
crescíamos
e vivíamos...
e éramos vultos comestíveis como as folhas dos plátanos adormecidos
queríamos a paixão e vinha até nós a solidão
desejávamos o prazer
e acordava em ti a desilusão de deambular sobre os coqueiros em papel...


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 11 de Janeiro de 2014

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Tsunamis...

foto de: A&M ART and Photos

A nocturna profecia do chorado sexo oral
o carro estacionado junto às lágrimas da Barragem embrionária
um barco apita
e da tua boca delírios de sémen como tempestades de silêncio...
a nocturna loucura do sexo entre as tuas mãos
e tu acreditando nas estrelas inventando labaredas de cinza como bonecos de peluche entre as tuas coxas
dizes que adoras o sexo pelo sexo
e choras como uma cabra embainhada nas ardósias dos tristes Tsunamis...
e antes deles as desejadas ejaculações na tua boca de fresta cinzenta
e antes deles... as tuas mãos deambulando gotículas de suor
vomitas os sons gemidos do prazer...
e no fim... arrotas... arrotas como uma criança acabada de acordar...
puta desalmada
cabra cansada pulando de carro em carro de cama em cama... e de cidade em cidade...
pinheiro bravio infernizando as sílabas do medo
trazes em ti o veneno
e a triste vergonha de seres como és...
a nocturna profecia do chorado sexo oral
rompendo a madrugada
descendo calçadas
subindo
subindo escadas... descalça... triste e puta... só
procurando pénis em todos os andares da ruína cidade dos ventos
e provocas e provocas... não percebendo tu que as estrelas são a limalha do ódio...



(não revisto – ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 10 de Janeiro de 2014

quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Deixar de acreditar

foto de: A&M ART and Photos

Desejar o sol é muito
porque nada desejei
escrever é estar vivo... amar quem nunca amei
e nunca quis acreditar nas esplanadas em vidro
desejar a lua é tão pouco pouco
para quem quer ser as frestas de solidão que embrulham o teu desnudo corpo
as flores
os cansaços emagrecidos do plasma adormecido,

Desejar é pouco ou quase nada
desejar o silêncio que embainham os teus lábios... desejei-o e cansei-me de esperar
que abrissem as janelas do doce colarinho de espuma que o mar deixa sobre os lençóis de seda...
desejar é tudo
desejar... desejar que arrefeça a tua mão
que cresça o tua paixão com asas em papel... desejar o sol
e ter a lua
desejar a lua
e ter apenas a sombra da montanha... sem o sol vomitando asneiras em palavras envenenadas
desejar-te como o és... uma rosa nua
de veludo
uma rosa apaixonada dos jardins suspensos que habitam a madrugada,

Sem fronteiras de cetim
deitada a meus pés...
desejar o sol é muito
porque nada desejei
escrever é estar vivo... amar quem nunca amei
e nunca quis acreditar nas esplanadas em vidro
desejar a lua
é pouco... tão pouco... tão pouco... que deixei de acreditar que estou vivo...


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 9 de Janeiro de 2014

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Francisco Luís Fontinha – Colunista “Divulga Escritor”


Chá de menta

foto de: A&M ART and Photos

O nosso mar se afunda
a lua veste-se de luar
e morre nas candeias de chapa que o silêncio olhar
transforma
mata
o nosso mar é desassossego em lata
voando sobre os coqueiros de prata
o nosso mar morre e desaparece na alienada cidade
sem norma
sem idade
o nosso mar é como a saudade
entre lábios siderais
e chá de menta...
oiço as árvores que cantam
os pássaros que não choram..
e este cacimbo que alimenta
a tua nossa dor... a dor de amar na dor de sofrer
a tua nossa tristeza que nos afugenta
sinto-te como sentia as cansadas vozes da madrugada
à janela da alvorada
um lenço em papel
triste triste como uma pétala
adormecida eternamente no coração de um pincel...
à deriva... à porta de um bordel.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 8 de Janeiro de 2014

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Frestas da solidão

foto de: A&M ART and Photos

Invenção do meu caderno negro
que a noite me pertence
que a noite me habita como uma carcaça de pão
que a noite me grita e me insulta...
como a um aldrabão
invenção
das tristes linhas paralelas que o cansaço vence
um polícia que me multa
e escreve com letra apressada o meu nome
morada
e eu... eu afogando na carcaça a minha fome
a minha mágoa na tua boca em meu divã deitada,

Invenção do meu caderno negro
da palavra
invenção do meu caderno impuro aberto nu com alma macabra
quando do esqueleto da vaidade
acorda uma cidade
um infeliz transeunte com sabor a madrugada
manhã submersa ensanguentada...
invenção
na paixão
misturada nas flores com plumas de mão...
da palavra
a palavra envenenada que o cisne entranha nas frestas da solidão.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 7 de Janeiro de 2014

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Ruas desnorteadas

foto de: A&M ART and Photos

A insignificante maré de desejo que a palavra deixa sobre o corpo envelhecido da morte
a espuma translúcida do abismo camuflado nas noites em delírio
o cigarro mal apagado
caminhando ruas pouco iluminadas
cadentes
velhas...
calçadas permitindo o sexo sobre os fantasmas das cortinas de fogo que saltitam do circo em miniatura
a insignificante maré que eu sinto na minha algibeira
fundeada em Cais do Sodré...
sem eira nem beira...
a terra não prometida
o deserto que te absorve e alimenta
e come em pedaços de açúcar misturados com azedos olhares
as árvores que sombreiam as tuas mãos de pérola emagrecida...
tão triste
e... e tão querida.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 6 de Janeiro de 2014

domingo, 5 de janeiro de 2014

E... Adeus; não voei e caí.

foto de: A&M ART and Photos

Limbos putrefactos onde habitam os esqueletos humanos, do húmus o húmus selvático que um insignificante transeunte transporta, desce a calçada, sobe as escadas do Adeus e depois, depois arrefecem as panquecas e os pastéis de bacalhau, há sempre preguiçosas luzes na calçada do senhor António Eu, há sempre pedras vestidas de sandálias e sandálias travestidas de pedras... rolam, rolam até que a noite cai sobre o alpendre da triste aldeia dos Macacos,
Vestiram-me de Anjo, colocaram-me umas parvas asas em sarja, não voei e quase caí da Mangueira abaixo, acreditando eu voar porque me tinham dito ser um
Anjo?
Sim, sim parvamente... um Anjo com asas e que nunca voou,
Caminhei e palmilhei calçadas, de sandálias parecia um parvalhão com asas enormes sobre os ombros, derreado, cansado... apeteceu-me insultar todos os presentes, chamei-lhes de filhos da mãe e a minha mãe
Triste,
E ouvia os Limbos putrefactos onde habitavam os esqueletos humanos, do húmus o húmus selvático que um insignificante transeunte transporta, desce a calçada, sobe as escadas do Adeus e depois, depois sente, sente sobre os ombros o peso da morte,
Triste, dizia-me ela,
Triste, ela sempre, digo-o eu,
Vagabundo imundo, dizia-me o senhor António Eu, e lá fui voando e tropeçando e caindo e me levantando, hoje olho-me numa fotografia, parvamente com asas, sorria
Pergunto-me, porque sorria este grande parvalhão?
Ora... se não voei, chorei, caí, me levantei, tropecei, cheguei a casa com os pés recheados de bolhas, subi a Mangueira e
Abri literalmente os braços, sentia as asas a prenderem-se aos ramos envelhecidos... e tombei sobre o térreo pavimento, junto a mim, estatelado do outro lado, o meu velho triciclo e o também meu parvalhão boneco de estimação, o
Chapelhudo?
Tardes inteiras a construir vestidos para este amigo e nunca conheci a sua família, e nunca
Quem vos mandou prometer?
Alguém prometeu se outro alguém ficasse curado, eu, o miúdo, fosse vestido de PARVALHÃO, levava asas de sarja e
Quase
Caí sobre o pavimento térreo acreditando que,
V O A V A...
Não voei, fui contrariado, também... quem os mandou prometer que eu ia sem me consultarem?
Não voei, não fiz mais vestidos para o chapelhudo, e quase
Vomitei,
Enjoei a principio quando (vejamos; a principio = no começo, e a princípio = em teoria), portanto está escrito correctamente, minha Adorável Senhora, continuando, enjoei a principio quando encontrei na descida um velho amigo meu, um famoso papagaio em papel, tinha quatro cores e um novelo de cordel, tinha-o roubado às rendas da minha querida mãe, e rendas refiro-me a crochet, não a outro tipo de rendas, que felizmente
Caí sobre o pavimento térreo acreditando que,
E enjoei, e vomitei palavras terminadas em
Alho,
Que confesso detesto, que odeio...
(Enjoei a principio quando (vejamos; a principio = no começo, e a princípio = em teoria), portanto está escrito correctamente, minha Adorável Senhora, continuando, enjoei a principio quando alguém me apelidou de “meu menino” e eu, olhei, eu... vi-o de bengala e não percebi o que ele fazia ali..., e a principio, não, não a “princípio”, a principio ainda acreditei que voava... pois se me tinham confirmado por escrito que eu era um anjo e credenciado para grandes voos...,
Grandes voos..., apenas fiquei-me por estilista do meu amigo Chapelhudo, e hoje, hoje tenho saudades dele e das suas mãos de borracha, e hoje...)
Hoje?
Ai... ai hoje, hoje... “Os Limbos putrefactos onde habitam os esqueletos humanos, do húmus o húmus selvático que um insignificante transeunte transporta, desce a calçada, sobe as escadas do Adeus e depois, depois arrefecem as panquecas e os pastéis de bacalhau”
E... Adeus; não voei e caí.
* E claro que o plural de pastel de bacalhau é pastéis de bacalhau; pastéis de bacalhau.


(não revisto – Ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 5 de Janeiro de 2014

Fotografia sem nome

foto de: A&M ART and Photos

Perspectivo-me sobre a sombra lâmina do teu sorriso de gaivota sem poiso
há uma linha transversal que nos separa e aproxima
como uma fotografia sem nome na mão do louco muro em xisto
desço às fronteiriças margens do desejo
desço até que sou engolido pelo cosseno de trinta e cinco graus dos teus lábios...
desejarás-me ainda depois das equações diferenciais dormirem dentro dos quadriculados cadernos?
Invejo-te a liberdade
e os voos nocturnos quando se esquecem de ti e tu
e eu
suspensos no estendal das sílabas poéticas que o veneno da tua boca alicerçou na tempestade
há em nós uma circunferência de luz com braços de areia
húmidas todas as palavras dos anzóis do medo das sanzalas com vozes de zinco
com olhos de fome...
e chove
chove sobre o teu corpo de nylon onde se abraçam os barcos desvairados quando o vento se entranha no amor e nos transporta para o infinito
e lá ao fundo... a sombra lâmina do teu sorriso de gaivota sem poiso.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 5 de Janeiro de 2014

No meu texto de ontem “Estoy enamorado” alguém me chamou à atenção que literáriamente não leva acento agudo no “á”. Ora literariamente é um advérbio de modo terminado em -mente, derivado do adjectivo literário com acento agudo, e também no caso de advérbios de modo terminados em -mente derivados de adjectivos com acento circunflexo, ambos os casos não levam acento nem agudo, nem circunflexo.
Ex:
Literário – Literariamente;
Só – Somente;
Espontânea – Espontaneamente;


Por alguma razão, no final dos meus textos, está bem explícito (não revisto). A verdade é que o dito comentário apenas existe porque uma dita senhora, com vários perfis falsos no Facebook, resolveu chatear-me, ou melhor, pensa que me chateia... digamos como dizia o outro; para me chatearem precisam de morder-me a.... ela já o fez e não me chateou em nada. Pior do que isso são as pessoas que lhe emprestam o perfil para ela fazer comentários em nome de outros...
FIM

Cigarro invisível

foto de: A&M ART and Photos

Puxo de um cigarro invisível e penso nos teus cabelos húmidos depois das chuvas de Inverno, recordo o lamacento labirinto de saudade que existia nos teus doces dedos envenenados pela paixão do silêncio, habitas como um pássaro no meu pobre e triste covil, habitas também tu, tal como o cigarro invisível, derretido em pedacinhos de cinza que voa sobre os desejos matinais das ardósias sem janelas, puxo e penso no cigarro invisível, estive quase a desejá-lo, estive quase a possui-lo... estive quase dentro dele como ele vive eternamente dentro de mim, inexplicavelmente... não o fumei, inexplicavelmente... não o puxei, manuseei-o na minha mão como uma munição perdida, esquecida... e
Sem nome?
Uma carcaça de fome, puxo, não puxo, invento, adormeço, me sento sobre as dores do andarilho covil da minha infância, viajo, regresso, embarco... sem medo, com medo, sem nome?
E puxo e regressam todas as palavras adormecidas, e puxo e regressam todos os desejos prometidos...
Ausente,
Sente,
E puxo, e puxo até que o dia acorde, até que a noite se deite, durma, finja viver quando a vida não se vive... come-se como rodelas de laranja...
E estonteante me sinto para acreditar em labirintos de prata, e estonteante me sinto... me sinto para sofrer paixões de xisto quando a húmida manhã se entranha no púbis da atmosfera encharcada de dióxido de carbono...
Sente,
O ausente,
E puxo de um cigarro invisível e penso nos teus cabelos húmidos depois das chuvas de Inverno, recordo o lamacento labirinto de saudade..., e não sei, e não sei se a noite é negra, encarnada... ou... ou de cor nada.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 5 de Janeiro de 2014