sábado, 1 de junho de 2013

Porque gritam os mabecos se as sandálias são de areia?

foto: Desenho de Francisco Luís Fontinha

Finjo palavras entre orgasmos cúbicos e gemidos triangulares, dizem-me que adormeci na loucura, que sou louco, estranho, até já me disseram que eu era esquisito, não tinha amigos, não conversava com ninguém, dizem que vivo num mundo construído por mim, só meu, apenas meu... e meus Deus que não acredito, tanta, tanta mentira sobre mim, e de mim,
Finjo,
Como todos os ossos fingem solidões de insónia sobre um divã emagrecido pelas sombras dos edifícios contíguos, das varandas, vasos com flores, umas belas, outras, também belas, mulheres, homens e crianças, saltitam sobre um arame fino, de aço, que atravessa o poço da mentira, e
De mim, as palavras que recusam ler, dizer-se fã, como eu o sou de gargantas em transe e coxas almofadadas pelas intempéries que atravessam-me em pequenas sílabas de iodo, o sal desaparece da claridade, como os iões entranham-se em mim, fingindo, mentindo das palavras, aos desenhos, dos vidros às janelas, nuas, despidas, vampiras imagens que sobejam de uma tela tristemente riscada, húmida como o ventre em delírio, o teu, quando percebes que nunca mais descerei da árvore onde vivo, me alimento, e escrevo,
As sempre parvoíces como parágrafos ilimitados, para todas as redes, e perguntaram-lhe
A senhora tem telefone fixo?
Não, menina, não tenho...
Ofereço-lhe um, é seu, para todas as redes, por apenas quinze euros,
Vigaristas trampolins de madeira falsificada, descalços, saboreando as sandálias com tiras de verniz, ontem oferecia-te livros, e livros, hoje, queimo-os, e queimo-os, ontem víamos da janela longínquas luzes que alguém nos dizia serem as lanternas dos salteadores entre marés
A senhora tem telefone fixo?
E vai e vem, descem, sobem, minguam, dilatam como cavernas imprimidas na rocha, sobre ti, nada, ninguém, vozes, algumas, poucas, mentiras, falsidades, mastigadas, por mastigar as ditas proibidas palavras, e repetem até à exaustão
Que sou, ou fui, que serei eternamente,
“finjo palavras entre orgasmos cúbicos e gemidos triangulares, dizem-me que adormeci na loucura, que sou louco, estranho, até já me disseram que eu era esquisito, não tinha amigos, não conversava com ninguém, dizem que vivo num mundo construído por mim, só meu, apenas meu... e meus Deus que não acredito, tanta, tanta mentira sobre mim, e de mim,” Porque apenas converso com eu quero conversar?
Porque me recuso a lamber as botas a quem quer que eu lhas lamba? Como muitos o fazem? Porreiro pá... mastigadas, as pastilhas elásticas, para mim, chuinga, quando acordam as mangueiras depois do cacimbo baloiçarem-se nas suas doces mangas, bajulação, estou eu farto, cansado, e não, e não me digam que eu vivo num mundo à parte, não
(cacimbo, mabecos, mangueiras, cubatas, sanzalas, musseques, chuinga, capim, machimbombo...)
Vivo num mundo real, vivo num mundo onde as pessoas são aquilo que são... e pronto.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

Os carris da saudade em direcção à minha caneta de tinta permanente

foto: A&M ART and Photos

Talvez um dia percebas porque dançam as minhas lágrimas
e navegam nos meus débeis braços os barcos de vidro martelado
talvez um dia entendas as personagens de mim
que são de ninguém
como sombras bailando debaixo da chuva
assim
como palavras entre linhas de um caderno negro
e os carris da saudade em direcção à minha caneta de tinta permanente

Talvez um dia o mar seja o nosso reencontro no mergulho do desespero abandono
que todo o pôr-do-sol sofre antes do cair a noite
e acordem milhões de parvas estrelas
que não falam
não escrevem
talvez um dia venhas a perceber quem sou eu
do que padece o meu empobrecido esqueleto
como um texto com duzentos e seis caracteres

Talvez... as minhas lágrimas
e navegam nos meus débeis braços os barcos de vidro martelado
que dos pomares de areia com sabor a amêndoa
do outro lado da janela
um menino embalsamado brinca com um parvo boneco
de nome chapelhudo
e talvez um dia um dia acordem as neblinas imagens de ontem
com as perfumadas sílabas de hoje...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

A tua ofegante mistela de cores dentro do teu peito

foto: A&M ART and Photos

Abandonaste-me e enviaste todas as tempestades que assombraram o meu velho cubículo de areia, a cubata tinha uma pequena janela com imagens de paisagens despidas, nuas, e travestidas, da sanzala chegavam até mim os uivos dos pássaros magoados pelas lâminas do final da tarde, havia pequenos charcos nas imaginárias covas do pavimento térreo, terminara a chuva, começava a noite, e o velho homem de vestes emprestadas pelo também velho compadre tinha acabado de roubar todas as estrelas do céu, olhava-o, e entranhava-se-me a escuridão fria e penumbra da noite em pequenas construções, abandonaste-me e tinhas-me pintado de negro,
Olhava-me no espelho do guarda-fato, e de mim sobejava uma imagem em papel com palavras inaudíveis, inacessíveis, palavras inventadas pela teoria do caos, abelhas, moscardos, ventoinhas com motores a diesel, e claro, sempre da janela da cubata, as imagens como feras de cera correndo sobre a procissão à volta do musseque, tinha-lhes medo, pintado de negro, fugi, escondi-me, transformei-me em Cinderela amachucada, primo meu, nuvem tua, rio dele, e porque desejavam as feias pétalas de incenso navegar na maré adocicada dos rebuçados de açúcar que o avô trazia na algibeira e distribuía no final do dia?
Nunca, nunca o entendi, como hoje não entendo a tua ofegante mistela de cores dentro do teu peito..., imagino-te uma tela branca com desenhos inanimados, cadáveres de porcelana em pequenos pedaços milimétricos, e de peso insignificante, desprezível, imagino-te como um balão voando sobre as janelas dos plátanos em frente à rua da escola, imagino-te, não imagino, percebo, deixei de entender as tempestades dentro do meu cubículo de areia, sinto as lágrimas invadirem a minha triste cubata, oiço lá bem longe, da vizinha sanzala os uivos dos mabecos embriagados pelas tuas garras de perfume fingido pela claridade dos cristais das sarzedas imagens das janelas de prata, havíamos imaginado zumbis sobre o zinco, e o último machimbombo com destino à cidade acabara de partir..., nunca, nunca o entendi, como hoje
Acabaram-se as tertúlias e as noites de vadiagem, acabaram-se as viagens ao interior das caves transeuntes por meninas de plumas e asas em cartolina, acabara-se-me a vontade de me sentar num banco de jardim, e esperar, que regresses, viva, morta, semi-nua, nua, em revolta, esperar, sentado, a contar as pedras que uma criança a brincar no parque atira contra uma pequena árvore, vou em duzentas e tu, ainda não presente, desisto, levanto-me, imagino-me caminhando oceano adentro, costa acima, saltito por dentro da ondulação com barbatanas de espuma cinzenta, acabara-se-me os sonhos, mar adentro, vou longe, caminho, caminho, levanto-me do banco de ripas acabadas de pintar
“Cuidado – Pintado de Fresco”
E... como hoje, acabadas de pintar, mergulhadas na água transparente que durante a noite desce sobre a sanzala, entra-me pela pequena janela da cubata, saio de dentro dela, como um recém-nascido, choro, grito, sorrio... invento-te regressando dos montes com pinheiros e bandeiras de pano cetim como quando íamos à Feira da Ladra comprávamos pequenos objectos sem significado, e imagino-me nas mãos da parteira, não me calava, berrava, chorava, fazia com que o zinco da cubata se erguesse e voasse sobre o vizinho musseque, como gaivotas, anos depois, em círculos À volta dos cacilheiros e de uma ponte em ferro, sentava-me, não no banco com ripas de madeira, sentava-me no chão, fumávamos cigarros e imaginávamos o vento bater na face rosada dos jardins de Belém,
E além, depois do grande momento quando as pequenas sanzalas se transformaram em jardins de púrpura, acreditei que nunca mais me “abandonavas e enviavas todas as tempestades que assombravam o meu velho cubículo de areia, a cubata tinha uma pequena janela com imagens de paisagens despidas, nuas, e travestidas, da sanzala chegavam até mim os uivos dos pássaros magoados pelas lâminas do final da tarde, havia pequenos charcos nas imaginárias covas do pavimento térreo, terminava a chuva, começava a noite, e o velho homem de vestes emprestadas pelo também velho compadre tinha acabado de roubar todas as estrelas do céu, olhava-o, e entranhava-se-me a escuridão fria e penumbra da noite em pequenas construções, abandonavas-me e tinhas-me pintado de negro”, acreditei que nunca mais pronunciavas o meu enfeitiçado nome...

(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

Havíamos exíguos perdidos espaços de uma casa abandonada

foto: A&M ART and Photos

Não és nada
eu que deixei de pertencer às esplanadas da noite amargurada
não és nada quando deixávamos suspensos nas cordas da tempestade
os silêncios os abraços e os olhos cansados das melancólicas marés encarnadas
não és nada
eu que deixei
da noite
envenenada
pela boca tua mão sibilada
havíamos exíguos perdidos espaços de uma casa abandonada
não
não és nada,

Não és nada
como sabíamos pertencer a um jardim com flores de pétalas feridas
garridas das faixas camufladas entre parêntesis e pontos de interrogação...
não
nada
como ninguém perceberia a tua ausência
de mim
da saudade inventada
por uma carta perfumada
não
sinto muito
mas... não és anda.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 31 de maio de 2013

Do medo, de olhar-te sem roupa e de não ser capaz de resistir à mais bela imagem a preto-e-branco

foto: A&M ART and Photos

(não foi por falta de tempo que ainda não escrevi sobre o teu corpo, mão porque o teu corpo seja desajeitado, não, porque ele é lindo, belo, desejado, não foi por falta de tempo, como os livros em fila de espera, como os textos em círculos dentro da minha cabeça, à espera de uma mão e de uma caneta, e claro, papel, não é por falta de tempo, mas confesso, que do teu corpo, sairá um dos mais belos textos, prometo, e não é, não foi, por, falta, de tempo, porque tempo, é certamente o que mais tenho...)
Não observava a luz natural desde que por decreto Real mandaram encerrar todas as janelas com vista para o mar, assim, deixamos de olhar os peixes em cardumes fingindo brincadeiras num qualquer jardim de uma aldeia encastrada na montanha bela adormecida, suas árvores diurnas caminhavam como pedras descendo ravinas, subindo escadas, galgando socalcos e olhando o Douro curvilíneo entre sombras e barcos imaginários, sentávamos-nos nas mãos flácidas dos pássaros negros com pintinhas brancas, recordavam-nos os velhos lençóis de areia que deixamos sobre a mesa da cozinha, quando também por decreto Real, tivemos de abandonar a cabana na margem direita da ribeira, pescávamos, às vezes, entre intervalos, entre palavras, oferecia-te um beijo, desenhava-te um abraço no teu corpo, aquele que espera pelas minhas palavras, que por falta de tempo, preguiça, quiçá... MEDO, ainda não o escrevi, sobre ele, olhando-o como se eu fosse o espelho de olhos verdes que te vê subindo as paredes do desejo, e esse belo corpo uma árvore semi-nua esperando o vento para se baloiçar nas cordas da manhã quando acorda, e as persianas do teu olhar, meias estonteantes, embriagadas pelo sono vernáculo que as palavras provocam no esqueleto feminino...
Tenho fome,
De ti?
Do medo, de olhar-te sem roupa e de não ser capaz de resistir à mais bela imagem a preto-e-branco, pendurada nas garras de um cortinado, velas parecendo lâmpadas, fósforos sobre o lava-loiças como silêncios em alumínio panelas, a sopa, o bacalhau esfriado, insosso, demolhado,
(apetecia-me um cigarro)
Invento nomes de objectos estranhos, lembro-me do hipercubo e de todas as histórias à sua volta, o porquê de ele ter nascido dentro de mim, das pessoas que me acompanharam, apadrinharam, coitadas delas, a paciência para me ouvirem sobre uma coisa quase estranha, mas real, lógica, geométrica, penso
Poderá o corpo nu ser um hipercubo?
E se
Penso, como serás quando todas as lâmpadas estiverem silenciadas, como as pessoas, de boca cerrada por um cortina de fogo, penso, como serás dentro das minhas mãos, quando eu, por uma mera suposição, manuseasse esse teu corpo de hipercubo, complexo, vagabundo no sentido poético, em desejo, eu,
E se, eu? E se eu transformar o teu corpo de hipercubo em flores com pétalas de papel, como as gaivotas, quando sobrevoam os teus seios...
Perceberás as minhas palavras, e dir-me-ás que sou louco, e dir-me-ás que já não queres, que eu, escreva sobre o teu corpo, o mesmo, aquele que é desejado e durante a noite se veste de hipercubo, sobe ao telhado e fica... assim, como eu, imune às imagens de marinheiros escrevendo nas paredes da madrugada...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

Os ausentados

foto: A&M ART and Photos

Acreditava no silêncio
e perguntava-me porque todos os ausentados
esqueciam as pequenas rochas às palavras acorrentadas em pedaços sofrimentos
entre aços veleiros e panos transparentes suspensos sobre a cidade das colmeias adormecidas,

Acreditava na madrugada
quando eu próprio mergulhava nas suas garras como um vampiro desalmado
triste
cansado,

E mesmo assim eu acreditava
no silêncio
nas palavras
e nos muros de vedação,

Acreditava no betão
e nos telhados de areia
nas nuvens e na chuva miudinha dos Sábados à tarde...
… acreditava que o teu corpo era uma fina folha em papel crepe,

Distante
fundida como as lâmpadas da sala de jantar com pratos embriagados
e talheres roubados
da mesa de um ricaço qualquer...

Acreditava como serpentes em madeira
correndo no corredor da vizinha
e do apartamento ao lado
eu acreditava nas imagens negras em sabão clarim...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

quinta-feira, 30 de maio de 2013

Pomba sem pátria


Significo nada
como uma pomba sem pátria
significo muito pouco ou quase nada
quando das ilhargas manhãs de Primavera
oiço as vozes camufladas
por nuvens e gaivotas acorrentadas,

Significo apenas um número com dígitos assombrados
significo quase nada no jardim das plumas árvores vestidas em purpúrea
entre migalhas de porcelana
e beijos inseminados nas ventosas gargantas da montanha branca
significo... não o acredito depois de ver desaparecer os muros em cartão
que separavam o meu quintal dos tristes fins de tarde,

Contávamos os barcos com letras pintadas a oiro
e bandeiras em pano de alecrim
gritávamos como os loucos entre janelas com grande ferrosas
e pequenos arbustos de asas de algodão...
significo nada
como uma pomba tristemente abandonada num País sem Pátria.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

Noite em reflexo do velho crucifixo

foto: A&M ART and Photos

Atravessávamos o lótus húmido da manhã
como eram as escadas que deslizavam ruela acima
sentávamos-nos sobre uma sombra gargantilha
e dos pinheiros mansos de Carvalhais
ouvíamos as eiras graníticas correrem em direcção à ribeira dos aflitos,

Éramos novos e crianças
mal sabíamos ler e escrever
e falávamos entre sons desconexos como pedras a invadirem a montra de uma ourivesaria
tínhamos livros
e apenas víamos as imagens deslizantes como serpentes sem cabeça,

Gostava de ti ainda
como às paisagens de África circunflexas no interior do osciloscópio
e mágicos invadiam as janelas com cinco vidros pintados de encarnado anoitecer
vinha a noite
e via-te encostada a uma jangada invisível na esperança de voares,

Nunca o fizeste como comigo depois de eu ter caído no poço da angústia
tínhamos na boca o sabor a ervas ou a bolhas castanhas com asas verdes
deslizavam sobre uma lâmina de alumínio como correm todas as bolhas
quando chovem diamante e lábios de areia
entre canoas e pedaços de osso argamassado contra os eléctricos da Baixa,

O rio da saudade ornamentava-se e entrava em nós como silêncios gemidos
sobre uma cama de pensão com paredes rendadas e crucifixos suspensos sobre a cabeceira
olhávamos-nos no espelho
e os nossos corpos nus misturavam-se com o reflexo do velho crucifixo
… e assim deixávamos em suspenso o amor canino com dentes de marfim...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

Sebastian Szymański - Your Soul (feat. Sławek Jaskułke, Grzech Piotrowski)


quarta-feira, 29 de maio de 2013

As cordas da tristeza correntes de abraços


Pendurava-me nas cordas da tristeza, sentia-me distante das pontes em madeira, algumas já em avançado estado de decomposição, de cheiro nauseabundo, também cansadas, ensonadas, como um esqueleto deformado pelas hélices das vertiginosas flores de Primavera, lá fora caminham pássaros que começam a aprender os primeiros passos, ainda não voam, mas... brevemente... ausentar-se-ão de mim, como se ausentaram milhares de estrelas, como se ausentaram centenas de sonhos, conversa fiada, uma feira de vaidades procurando abrigo debaixo do aquário nocturno da solidão, pendurava-me afinal sem perceber que em vez de cordas, eram correntes de insónia que eu durante o sono prendia ao meu corpo, e sentia-me pesado como rochas em queda livre em direcção ao abismo, abria o postigo e via coisas sem nome, coisas como simples objectos desproporcionais que o tempo encolhe, come, vomita como sendo corpos em aços, em fila, esperando a entrada no auto-forno, e entre cambalhotas e simples anedotas, eu escutava na paciência dos anjos femininos, os pássaros bebés em construções de areia, enquanto os olhava, recordava as aventuras de Fernão Capelo Gaivota, e imaginava-me um dia dentro de uma velha panela com arroz, algum feijão, e de sabor inconfundível a sonho, sonhar quando todas as grandes muralhas que a vergonha deixa das escadas para o patamar do terceiro esquerdo, a varanda cambaleava-se, embriagada pela vodka que os marinheiros Russos tinham deixado sobre os carris dos lençóis depois da ejaculação de palavras, que posteriormente, davam vida a poemas, e dos poemas, crianças, algumas pareciam vampiros com lenços de seda enrolados na cabeça, ouvia-se o desgraçado milagre da chuva de pérolas que todas as noites, sem horário definido, caía desordenadamente em nós
Sabia-te dormindo na cama do quarto encurralado entre a cozinha e a casa de banho, sem janela, e apenas uma porta de pano dividia-nos, quando te deitavas, imaginava-te sobre mim, nua, como um cobertor de lã em noites frias e que tínhamos desistido dos sonhos que esboçávamos conforme a mesma varanda, quando sóbria, deixava que nos sentássemos, com a condição, de, “Proibido Fumar”,
caía desordenadamente em vós os desejos das paralelas linhas azuis que circulavam em redor de um jardim com árvores, e confesso-o, as únicas que até hoje conheci, e que voavam, como os pássaros que eles imaginavam nas pequenas brincadeiras enquanto, os mesmos, tentavam voar com a ajuda dos papás e das mamãs, eles, aqueles que apreciavam o desgraçado milagre da chuva de pérolas que todas as noites, sem horário definido, caíamos diziam eles, caíamos das nuvens incolores que um artista plástico tinha pintado no tecto da cidade dilacerante, uma cidade velha com pessoas vestidas de negro, com pessoas voando como os pássaros, uma cidade...
Há tanto tempo que não sei o significado de cidade, de rio, de mar, de barcos, jangadas e beijos, e abraços, e lanternas mágicas, slides nas paredes encastradas que o velho João tinha deixado por esquecimento numa noite em princípios de Setembro, faziam-se apostas sobre o término do mês, e enquanto uns, os mais optimistas acreditavam que terminaria com flores sobre as mesas de granito, outros, os outros, os não optimistas, apenas que nunca terminaria o desgraçado mês de Setembro, para mim, e se eu mandasse, ainda hoje, ainda hoje
(setembro, o mês dos beijos debaixo das palmeiras)
Era setembro, sem dúvida, alguma, sempre Setembro, sempre... o eterno mês dos beijos debaixo das palmeiras, e a Ilha de Faro parecia um ponto de luz no centro do Oceano,
E de longe, via os aviões estacionados na pista, via o mar, via os barcos, mas esqueci-me da cor dos olhos do Sábado e do nome de cada palmeira junto à marina...
acordou a noite
E voamos entre os lençóis do verdadeiro amor.

(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

As palavras agastadas

foto: A&M ART and Photos

Sentavas-te nas clarabóias do sorriso insónia madrugada
e eu imaginava-te voando sobre a cidade
voando desesperadamente como quem procura árvores baloiçando no vento de ninguém
em braços de aço sem odor sem fingimento
e no entanto tínhamos dentro de nós pequenas papoilas falsificadas
que um comerciante estrangeiro tinha estonteantemente inventado durante a noite desgovernada,

Éramos de pano como os cortinados da tia Adosinda
e vestíamos-nos enrolando-nos em palavras doentes com cabeças de néons abandonadas
pelos transeuntes imaginados na loucura das horas da Aspirina após o jantar...
havia uma janela de suor que escorria do teu corpo insuflável
porque das tuas palavras cresciam cravos encarnados como clavículas desperdiçadas depois de morto o esqueleto de água salgada,

Chovia-nos como chovem as lágrimas dos pilares de betão
quando do silêncio acordam mangueiras e capim envenenado
tive o mar na minha mão quando criança
como em nós
choviam barcos com plumas e rímel nos olhos transatlânticos em sinais de fumo,

Tocávamos cigarros por cigarros
beijávamos-nos dentro de um poço de prazer quando a lua escondia os mapas e as bússolas
que nos impediam de viajar pelas grandes planícies do medo e dos corpos suspensos na morte
chovia-nos como chovem pequenos adereços em papel e havíamos de encontrar uma porta
em fina cerâmica com bilhete para a eternidade...

[oiço “Eu Seguro” Samuel Úria e Márcia]
Encontro-me plenamente “SEGURO” porque já partiram os paquetes ensonados
e das poucas ruas ainda acordadas hoje nesta cidade
apenas uma a tua boca de Inferno
saboreando portas e janelas que as rochas transportam para a ilha do desejo
sem sabermos porque choravam os barcos com rímel nos olhos e plumas e cores nas faces rosadas da íngreme tristeza das asas de cartolina com palavras agastadas...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

terça-feira, 28 de maio de 2013

Estranhamente só como as lâmpadas de algumas cidades

foto: A&M ART and Photos

Sentia-me sem asas enquanto olhava os pedaços de vento que a manhã fazia acordar, ouviam-se-lhes em gargantas ocas, palavras de afecto, carinho, e desejo, havia árvores que balançavam, e não havia veleiros em passos curtos, sobressaltados, como os anjos quando sobem aos postes de iluminação pública e aclamam o nome, o meu, mas em vão,
A escada de acesso ao cais, em poucos segundos, ruiu, evaporou-se como se tinham evaporado todos os barcos com partida marcada para as nove horas da manhã, e já nas oito, desapareceram como abelhas depois da tempestade aportar nas flores em pólen adormecido, ninguém gostava de mim, porque diziam que eu era estranho, estranhamente só como as lâmpadas de algumas cidades, quando são despejadas as ruas dos velhos mapas, suspensos nas paredes caquécticas do desassossego e morte, havíamos de construir um rapaz robusto e cheio de vitalidade, diziam
Tal e qual o pai, perguntava-me, qual deles?
Queria ser bailarina, costureiro, queria ser marinheiro, navegador de barcaças entre a margem norte e a margem sul, queria ser guardião de mabecos no capim da saudade, queria ser papagaio de papel ou sombra de jornal, portão de entrada num quintal do Bairro Madame Berman, queria ser nuvem, escada, avião, barco cansado, prostituto, barco simplesmente, como as canções dos melros quando me encontro entre o acordar e o não acordado, havíamos de encontrar uma Baía com palmeiras, víamos o mar, havíamos de comprar duas cadeiras, e
Diziam que nós, e não ligávamos tão pouco ao que nos diziam,
Porque as nossas fotografias tudo dizem, é só o esforço de folhear os dois álbuns e recordar, imaginar que ainda estamos vivos, e depois de sentados nas duas cadeiras que tínhamos comprado, ouvíamos o rosnar do mar dentro dos nossos peitos, tu
Eu pegava na tua mão silenciosa, por vezes tão ausente como a tempestade nos finais de tarde, havia pombas no galinheiro que comiam juntamente com as galinhas, e sentia-me liberto das tristezas manhãs quando além de ouvir os murmúrios do mar, ouvia os ruídos da tua mão caminhando vagarosamente no meu ventre, e descia vento, e levantavam-se-lhes os cocos até que das vozes sem corpo, renasciam solidões de azoto, e paixões de insónia, eu, na tua mão, no teu ventre, tu, caminhavas-me mar adentro, e as cadeiras de vime voavam em direcção à ilha dos desejos, hoje não, confesso-te, ainda te amo, como te amava quando brincávamos entre bananeiras e corridas de cavalos, jipes saltimbancos correndo de musseque em musseque, davas-me a mão, remexias-me o ventre como se eu fosse a algibeira perdida dos calções de pano, e mesmo assim,
Diziam que nós, e não ligávamos tão pouco ao que nos diziam, éramos folhas de papel e que apenas servíamos para limparmos o rabo
(branco é papel que só serve para limpar o cu)
E acredito que ainda existem nuvens envergonhadas nos telhados de zinco, as pombas coabitavam alegremente com as galinhas, tu, coabitavas alegremente comigo, que diziam
É estranho, este miúdo,
E gostavas de mim como gostávamos dos silêncios navegantes das flores em despedida, encerrado o caixão, ele entrava num túnel de alegria até chegar ao rio, entrava na profundidade da tristeza, alimentava-se de beijos, bocas, lábios simplificados pela regra do quadrado, extraíamos a raiz quadrada do teu corpo, e ficava com nada, zero, bananas, latidos de mabecos envergonhados e pouco mais, e tudo porque um dia, um dia de tarde, disseste-me
Amo-te, querido João,
Confesso, não sei ainda se te reconheceria no amontoado de fotografias, antigas, éramos crianças em viagem e que acreditávamos no regresso dos pássaros depois de partires, e esperávamos, esperávamos...
Até que adormecíamos de mão dada
(branco é papel que só serve para limpar o cu)
E ainda não ouvíamos comboios a apitar dentro de nós.

(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

Como tu em ripas do jejum anunciado

foto: A&M ART and Photos

Queria ser como tu não sorrido como eu
queria ser um veneno que habitasse no teu peito
um construtor de insónias
um transeunte faminto combinando encontros nas paragens do eléctrico
sem bilhete e despido e ausente deprimido,

Queria ter-te e ser como tu não sabendo que lá fora choram as garças
que amanhã é quarta-feira e as nuvens deixaram de ser em algodão
e as horas não são não
mais torrões de açúcar deitados na tua mão
queria ser como tu e não saber que existem noites em noites como noites...

Assim nuas despidas contínuas e semeadas entre planícies e almas desesperadas
como tu eu um esqueleto de vento saboreando pipocas
numa cadeira junto ao rio
sonhando não sonhando com frio em cio
como tu quando acordas e dás-te conta que eu nunca existi em ti,

Porque sou um banco simples de jardim
como tu em ripas do jejum anunciado
queria voar como voavam os teus cabelos no silêncio dos paquetes em movimento
como tu eu assim... deambulando na ponte para o amanhã não sabendo dizendo
como tu que as rosas têm espinhos de porcelana e lábios de andorinha,

Porque sou um camelo desorganizado
não como tu porque tu és sossego e plenitude prometida
palavras em degraus de escada
contra o corrimão assim como tu deitada
à espera que regresse a madrugada dos ilustres corredores da paixão...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

segunda-feira, 27 de maio de 2013

É com enorme prazer e alegria que participarei com poemas meus na “Poesia Sem Gavetas- Aqui há Poetas, Parte II. Obrigado.

A minha vida é como uma roleta

foto: A&M ART and Photos

Sentia os rosnares engasgados dos automóveis ensanguentados pela paixão que em noites de escuridão, descia, solenemente, tristemente, às vezes, digo-o, alegremente, Porque não? Se o meu peito era o porto de abrigo dos teus braços de arame fingindo fileiras de madrugadas sobre as sobrancelhas antes de acordarem as manhãs, depois, o mesmo de sempre, a tempestade de sempre, a vida, sempre a vida em vida, completa, complexa, imunda, desperta como as flores do teus olhos, meu amor, meu amor das árvores envelhecidas, e do mostrador de um relógio, tu, a tua pele, os teus ossos em plasmas de fim de tarde, as rugas, os teus medos, o aço do teu peito quando o poisavas em mim, entre nós, réstias de insónia, angústias que provocavam os cigarros depois de fumados, havia no tecto do desejo, uma linda colorida lâmina de luz, camuflada, como tu, escondido entre o zero e o mil novecentos e oitenta e oito, nove vezes nove, atravessávamos o rio, olhávamos a ponte enferrujada pelos beijos das gaivotas sobrepostas nas rimas que sobejavam dos loucos poemas que tu inventavas, e sentias-me dentro de mim, e sentia-te deitado no perfume que atravessava a ruela entre gemidos e assobios do amolador de tesouras,
Eras tu?
O sangue, o teu, o meu, sabia-nos a poemas envenenados pela neblina de uma cidade flutuante, cacilheiros de ossos procuravam lânguidas línguas de prazer, comíamos coisas esquisitas, frágeis, como corpos acabados de nascer, tínhamos o prazer guardado dentro da gaveta da mesa-de-cabeceira, sobre nós, uma pilha de livros, e nervos, e plantas que eu, tu, que nós nunca percebemos para que serviam, apenas viviam, como nós, simples sombras, complexas manhãs de iodo, a areia fundia-se e filmava-nos como um espelho de luz a absorver os orgasmos das palavras esquecidas na ardósia que havíamos suspendido na parede da sala de jantar, amar-me-ias?
E eu sentia, as plumas do teu peito deambularem nas janelas gradeadas que escondiam o sofrimento das nossas almas, não, não consigo recordar os Sábados entre feiras de velharias e as idas à feira da ladra, ouvia-te numa roleta de casino clandestino, apostava-te todo, e saía-me um par de ases, porra, fico teso, uma semana, um mês, dois, três meses de miserabilidade, e no entanto, sabia-me feliz, subia cambaleando as escadas que me levavam aos teus braços de roseira bravia, indomável, e trazia na boca as sombras do hálito do vodka misturado com sumo de laranja, deixa-te sobre a mesa um bilhete de despedida, “regresso dia 23”, e sabias que eu, jamais regressaria, porque a minha vida é como uma roleta do casino clandestino,
Sempre, sempre saem asses, e sempre que eu perco, e no entanto
Contente, feliz, ausente, sou uma roleta em círculos em busca de uma par de ases, apenas um, um só,
Tinhas a certeza que era eu?
Diziam-me que sim, e no entanto, tu, e no entanto, eu, e no entanto, nós, dois corpos misturados na penumbra solidão procurando uma, apenas um, par de ases,
Pouca, coisa, a nossa triste história,
Tinhas a certeza que era eu?
Nem eu, nem eu,
Regressamos a nós.

(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

O esconderijo

foto: A&M ART and Photos

Sabia que te escondias na sombra de uma locomotiva louca
entre carris imaginários
e praias de incenso sobre tingidas nuvens amarguradas
sabia e não fazia nada
deixava-te sombrear nas planícies rebeldes da solidão,

Inconstante este amor que os comboios deixam nos socalcos ao rio doirado
milagrosamente só como sandálias de couro e pingos de espuma
e o mar transpirava
e quase me levava até à pedra onde te sentavas
só como eu só nas locomotivas loucas,

Sabia que te escondias... louca
entre cartas invisíveis nas palavras famintas
sabia-o e nada fazia para te resgatar da ausência que a saudade constrói nos sorrisos de amendoeira
e olhava-te como uma louca locomotiva em movimento
procurando sombras que o rio Douro vomitava...

Tínhamos um mala simples com objectos simples com destinos diferentes
eu sabias que me transportava para Sul
e tu
tu fingias transportares-te para Sul obliquamente sabendo-o que irias para Norte
opostamente de mim como uma serpente envenenada,

Hoje somos apenas dois cadáveres de areia que o tempo
semeia sobre a água salgada onde se escondem os teus seios de cereja
e brincam as tuas coxas como livros em poesia depois de lidos relidos e transcritos
pela louca locomotiva
de uma imagem a preto-e-branco...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

domingo, 26 de maio de 2013

Havíamos construído um casulo circular na profundidade do silêncio

foto: A&M ART and Photos

Mostra-me onde fica o mar, sussurra-me poemas como quando sinto os cortinados da minha janela, porque acorda o dia, a cintilarem, dançam entre vidros e sombras de luar, mostra-me, se não tiveres medo, onde fica a casa do amor, o silêncio do desejo, mostra-me, sem pudor das imagens, o mar, as palavras do mar, fica, não vás agora para a distante solidão dos desejos de amar, mostra-me, mostra-me o que é o amor, e eu, oferecer-te-ei este desenho, este desenho das minhas mãos, quando eu, ainda tinha mãos, e tu, vagueavas dentro da minha cabeça como os peixes no aquário da paixão; amar-me-ás? E se eu confessar-te entre murmúrios e sons melódicos que te amo... zangar-te-ás como fazem os pássaros quando lhes retiramos os cobertores nocturnos da geada? Guarda-o, e não tenhas medo, deste, dos outros, de tantos e tantos... desenhos meus, porque teus fantasmas são,
o branco negro da solidão, precisarei de lágrimas como tormentos meus para perceberes que a minha pobre embarcação, velha, cansada, começa, aos poucos de nada, a meter água, enche-se de medo, desassossego, e eu, espero-te desde ontem na ponte dos camuflados soldados de chocolate, lembras-te de mim, ainda?
São, todos teus, os tristes desenhos meus, porcarias sem nexo, e avança sobre mim a vergonha, a língua de fogo que a manhã transforma em dor, em poeira,
ai a poeira...!,
E não, não o digas mais, que a culpa foi dos morcegos, das equações de Einstein... porque não, não são os tectos da relatividade os culpados pela ausência de barcos na nossa cama, se ainda temos cama, sono, tempo para abraços, não, não foram os cansaços, culpados, prendam-me se for necessário, acorrentem-me a um cais de embarque, que eu, eu lanço-me ao mar, rio, onde vocês quiserem, mas... não culpes o Einstein
havíamos construído um casulo circular na profundidade do silêncio da areia, vestias-te de encarnado, a blusa, e das tuas velhas calças de ganga, ouviam-se-lhes ainda os gemidos da noite anterior, tínhamos medo, nós éramos o medo disfarçado de poesia, e inventávamos poemas nas descamadas conchas perfumadas dos moluscos envenenados por algas, ruídos de automóveis em confrontos desnecessários com os vizinhos do rés-do-chão, e tu, dizias-me
Amo-te,
eu, parvamente, engolia palavras, comia-as, como hoje almoço os livros que leio, como ontem dormíamos sobre os lençóis de seda com desejos prometidos, Amo-te, dizias-me tu, eu, e nós acreditávamos no largo das palmeiras, e enquanto te sentavas junto ao lago víamos os cisnes a dançarem nas encostas socalcos do Douro, havíamos
Amava-te, digo-o hoje, e comia-as, alimentavas-te de pequenas gotas de suor que o teu finíssimo corpo transbordava quando as minhas mãos
escrevias no meu corpo palavras, desenhavas-me e dizias-me que a tela dos meus seios, pequenos, ínfimos, tinham sussurrado o teu nome enquanto esperávamos pelo comboio para Alcântara, havia barcos estranhos nas nossas costas, crestados abraços, milímetros quadrados de tristeza, a saudade, escrevo-te, escrevo e peço-te que,
As minhas mãos, inventávamos sonhos e Primaveras, que
peço-te que não culpes o Einstein...
Que, e dizias-me, onde ficava o mar, sussurravas-me poemas como quando sinto os cortinados da minha janela, porque acorda o dia, a cintilarem, dançam entre vidros e sombras de luar, mostra-me, se não tiveres medo, onde fica a casa do amor, o silêncio do desejo, mostra-me, sem pudor das imagens, o mar, as palavras do mar, fica, não vás agora para a distante solidão dos desejos de amar, mostra-me, mostra-me o que é o amor, e eu, oferecer-te-ei este desenho, este desenho das minhas mãos, quando eu, ainda tinha mãos, e tu, vagueavas dentro da minha cabeça como os peixes no aquário da paixão; amar-me-ás?
peço-te que não culpes o Einstein... , e havíamos de cruzar os Oceanos arbustos que Belém aconchegava, e um rio,
Chorava,
tu choravas ensanguentando os meus braços de cinzentas lágrimas...
E choravas, sentia-te dentro dos lenços de papel.

(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

Querida melancolia tarde de Domingo

foto: A&M ART and Photos

Estás tão triste querida melancolia tarde de Domingo
o vento levanta-se dos teus anseios cabelos
como o mar se acorrenta nos teus abraços
dos belos castanhos beijos
e os medos vaiados pelos poemas teus olhos
que alimentam a tua boca em desejo,

Tão tristes as paredes ruínas que encobrem as tuas melodiosas canções de amar
sabendo tu que o amor é um Sábado disperso e cansado
comendo amêndoas recheadas com chocolate e pequenos versos
e grandes nadas
tão triste querida palavra que não sou capaz de pronunciar...
porque hoje é Domingo,

Porque hoje é melancolia adormecida
luz em pequenas lâminas de silêncio
sobejantes janelas sem os cortinados do dia...
uma ardósia encolhe-se-te no centro dos teus seios
e todas as palavras de amor
choram como crianças arrependidas...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

E a fome das coisas prometidas

foto: A&M ART and Photos

Percebiam-se-te cansaços que o tempo alimentava
flores dispersas como sandes de solidão
sobre uma cama encharcada
fina distância a janela da paixão
que a noite alicerçava,

E a fome
meu amor madrugada
que nuvens vorazes galopavam nas searas abandonadas
e a fome das coisas prometidas
dos livros murmúrios palavras,

Amor... lâminas de vidro que a espuma do mar recordava
entre a loucura e as lâmpadas do silêncio encardido dos candeeiros cadáveres
amor só como areia dispersa na imensidão da poesia
de dia
o amor... amor que não amava,

E desejava
sabia-te adormecida nos confins sulcos que o estômago rejeitava
vogais sílabas e imagens do teu corpo imprimido no céu petroleiro
e sobejava sabia-te dorida pelas mãos das ilhargas madeiras da Primavera
que o meu coração imaginava,

Chorava-te como lulas grelhadas
dentro da barcaça da alvorada
percebiam-se-te cansaços e limonadas
como este maldito zumbido da esplanada criança tristemente apaixonada
tristemente... recheada nos lábios teus finos beijos que as pétalas do amor o vento transportava...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha